A Instrução Normativa nº 1.719, da Receita Federal, publicada recentemente, regulamentou a tributação da remuneração do investidor-anjo pelo imposto sobre a renda. Ocorre que a referida instrução vem na contramão ao incentivo da instituição do investidor-anjo, criado pela Lei Complementar nº 155/2016, que objetiva incentivar os investimentos na inovação e produção, ou seja, desprestigiando o interesse consagrado no artigo 61-A, na Lei Complementar nº 123/2006.

Em breve análise, a norma infraconstitucional – Lei Complementar – foi introduzida num contexto das chamadas startups, que são empresas geralmente em estágio embrionário, dependendo de investidores para criar e formatar um modelo de negócios inovador, agregando alto valor de retorno. Com o pretexto de regular o tema, entendemos que a Instrução Normativa nº 1.719, da Receita Federal, extrapolou a sua competência e, ao mesmo tempo, prejudicou os interesses subjacentes de estímulo aos investidores-anjo.

O artigo 5º, da aludida instrução, determinou a tributação da remuneração auferida periodicamente pelo  investidor-anjo no aporte de capital, submetendo-o ao imposto sobre a renda por alíquotas regressivas em função do tempo do contrato de participação que o fundamenta (22,5% para 180 dias; 20% de 181 a 360 dias; 17,5% de 361 a 720 dias e 15% após 720 dias). Ocorre que, segundo o artigo 61-A, §4º, III da Lei Complementar nº 123/2006, o investidor-anjo será remunerado pelo aporte de capital, nos termos do contrato de participação, pelo prazo máximo de cinco anos. Já o §6º, do artigo 61-A, regula essa remuneração, ao estabelecer que ela será devida ao final de cada período, correspondente aos resultados obtidos, não superior a 50% dos lucros da ME ou EPP.

Pois bem, adotando-se no contrato de participação uma remuneração correspondente aos resultados obtidos consistente em percentual dos lucros da sociedade até o limite de 50%, essa remuneração equivale aos dividendos recebidos por acionistas de sociedades anônimas. Salienta-se que, o risco do investidor-anjo é maior do que de alguns acionistas, pois sequer possuem direito de voto, conforme refere artigo 61-A, §4º, I, da Lei Complementar nº 123/2006. Logo, não nos parece haver margem para dúvidas: o investidor-anjo recebe dividendos, que constituem a parte do lucro distribuída em remuneração ao capital investido na sociedade, seja ele por meio do capital social (integralização, compra de quotas ou de ações), seja ele pela nova figura do aporte de capital criada pela Lei Complementar nº 147/2014.

Dessa forma, resta latente a ilegalidade da Instrução Normativa nº 1.719, da Receita Federal, pois determina a incidência do imposto sobre a renda sobre fato previsto como isento da tributação, conforme já demonstrado, mormente, porque o investidor-anjo não possui os mesmos direitos e prerrogativas dos sócios/acionistas (justificando, portanto, uma tributação diferenciada). Em verdade, a referida instrução equipara situações “não equivalentes”, porque tanto as alíquotas regressivas quanto o tempo de permanência do investimento necessário para sua redução nela estabelecidos são idênticos aos previstos para os rendimentos auferidos em aplicações financeiras de renda fixa ou variável, previstos no artigo 1º, da Lei 11.033/2004, violando, assim, o principio da isonomia aristotélica.

Não há com equiparar o investidor de “atividades de inovação e os investimentos produtivos” com o o investidor do mercado financeiro (aplicações), sem violar o princípio da igualdade. Logo, a Receita Federal tributa ilegalmente o investidor-anjo com base na Instrução Normativa nº 1.719, desprestigiando a Lei Complementar nº 123/2006.

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